quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Carta a Bernardino Soares



Olho para o teu retrato e perco.me no teu olhar vazio, mas que aos meus olhos está sempre tão cheio.
Cada vez sinto mais a tua falta. Falta de partilhar a minha solidão contigo, de sentir esta dor a dois e não apenas minha. Ai, como eu estou cansada. Cansada de pensar, de ser.
Adorei aquela tua carta. Sentia tão minha, tão pessoal.
Trago-a comigo e não tenciono esquecer.me dela. Quero lembrar-me, quero lembrar.te. Quero que fiques e jamais te vás embora.
Com aquela carta, por momentos, esqueci tudo. Esqueci como e difícil pensar e, simplesmente vivi e senti. Fez.me tão bem. Senti.me Caeiro. Experienciei apenas os meus sentimentos e emoções, vivi apenas o que era simples e apaguei em mim tudo quanto de complexo podia existir.
Mas (in)felizmente, eu tenho pouco de Caeiro,e para compensar, tudo em mim é Campos. Vivo tudo ao máximo. Todas as minhas emoções, todos estes sentimentos, todas estas sensações que são levadas ao seu êxtase.
E isto cansa.me. Sinto.me esgotada. Para desistir só falta dar um passo em frente e dizer: BASTA!
Mas algo me prende, algo me impede. Algo não quer que eu o faça, ou talvez, seja apenas eu a não querer desistir.
Se realmente é ou não a minha força de vontade a impulsionar.me, eu não sei, mas e algo que de certa forma me deixa mais tranquila. Não cheguei ao meu limite, mas já me encontro no seu limiar, talvez a manha la chegue...
Hoje ainda me sinto tua. Ainda que com a minha total insanidade, sinto.me tua. Sinto.me minha também.
Queres saber uma coisa?! Sinto.me tanto tu. Sinto que fraccionei o meu 'eu' e em vez de um, tenho vários. Mas sabes o que e mais curioso?!Não me sabia assim tão versátil, e se isso por um lado me fascina, por outro lado, somente me intriga, me assusta.
Fascina.me toda esta minha versatilidade, todo este meu ser multi-facetada, mas intriga.me e assusta.me a reacção dos outros. Não quero ser compreendida por todos, tal como tu, procuro apenas que de quem eu goste me compreenda. No entanto, tenho medo de que nem esses. Sentiria.me ainda mais só.
Enfim, serei sempre em ser complexo que pensa demasiado, ou talvez não.
Talvez isto nos responda a esta nossa duvida crescente da incompreensão:
'Há em olhos humanos, ainda que litográficos, uma coisa terrível: o aviso inevitável da consciência, o grito clandestino de haver alma'.
Considero.a das melhores frases que tu, Bernardino, jamais escreves.te
Tens a alma na ponta dos dedos, e essa tua sabedoria escorre juntamente com a tinta da tua caneta, de forma a que uma folha de papel seja preenchida.
Invejo.te. Invejo a tua sabedoria que te é desconhecida, mas que eu conheço tão bem.
Contigo aprendi a: 'Ser, só ser'.





Para sempre tua...

2 comentários:

  1. "Tens a alma na ponta dos dedos, e essa tua sabedoria escorre juntamente com a tinta da tua caneta, de forma a que uma folha de papel seja preenchida."
    Já aprendeste a ser?... Então ensina-me. ;)Já fazes isso às vezes não? Quando a lua já vai alta e as nossas pestanas se querem fechar. Talvez por isso nos vejamos tão bem... Nem sempre são precisos os olhos abertos. Ás vezes são apenas os ouvidos à escuta. ;)

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  2. Tenho o mesmo medo que tu: não ser compreendida por aqueles que mais amo. Mas uma coisa sou diferente: sinto-me como Ricardo Reis ("Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos"... e às vezes vale a pena!). Guarda-o bem, o Pessoa é um tesourinho**

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